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tim (16/01)
Dá hora sua história em Morrocoy! Estou indo neste 2015 pra lá...levar...
Magá (16/01)
Olá.... Algum contato do sr. Hector Luis ou do seu "novo amigo"? Quero ...
Magá (16/01)
Olá Rodrigo e Ana.... Esses dias estava dirigindo na minha cidade (Ribe...
carmem (15/01)
carmem (11/01)
Mergulho com tubarões feito em Nassau - Bahamas
Todo mergulhador gosta de ver vida embaixo d'água. Peixes. Peixes grandes. Arraias, golfinhos, polvos, tartarugas, baleias. E tubarões. Esse nome costuma dar calafrios. O filme de Spielberg marcou uma geração. Pessoas não dormiam mais direito e não entravam mais no mar. Mas, na verdade, o filme fez muito mais mal a espécie que retratava do que a esses pobres insones. Foram caçados inclementemente, mas a vida deles vem melhorando pouco a pouco, com o intenso trabalho da comunidade de mergulhadores e, principalmente, por canais como Discovery Channel, Natgeo e Animal Planet.
Esses animais são magníficos. Quem já os viu nadar graciosamente pelos mares, eficiência hidrodinâmica ao extremo, compreende e reverencia essa obra-prima da natureza. Não é à tôa que estão por aí desde o tempo dos dinossauros.
Enfim, já deu para perceber como sou fã deles, né? Sempre os procuro nos meus mergulhos. São raras as vezes que os vejo e sempre considero um prêmio os poucos segundos, raramente minutos que consigo acompanhá-los embaixo d'água. É porque eu ainda não tinha vindo ao lugar certo. Aqui no Caribe, é muito mais fácil observá-los. Hoje mesmo, assistindo ao Weather Channel, que mostrava Nassau vista de um avião, deu para ver vários, passeando aqui por perto. Engraçado... vistos de cima, de fora d'água, eles dão medo. Como banhista, também me assusto. Mas, embaixo d'água, não há espaço para medo. Apenas admiração.
Fomos a um mergulho especial hoje. Um mergulho onde assistimos tubarões sendo alimentados. Há toda uma preparação psicológica antes do espetáculo. Primeiro, um mergulho de preparação, onde o guia nos leva pela crista de um barranco, que desce dos 10 m aos 6 km de profundidade. Isso mesmo, 6 quilômetros! É a chamada "Língua do Oceano", uma fossa abissal bem ao lado de Nassau. Olhar para o azul escuro desse poço sem fundo (ou quase) me dá muito mais medo que os tubarões que já nos seguem, de longe, nesse mergulho. Sabem que a hora do lanche se aproxima. São tubarões médios, de dois a três metros. Curiosos, se aproximam e se afastam. Orientados pelo guia, não nadamos em direção a eles. Seria estupidez. São muito mais rápidos que nós e são eles que controlam a distância que querem ficar. Após alguns minutos, já estamos acostumados com a presença dessas criaturas em volta de nós. Uma dúzia deles. O mergulho termina num grande campo de areia, com pedras colocadas em forma de círculo. Uma arena, que mais parece uma Stonehenge submersa, o que lhe dá um ar bem mais solene, quase fantasmagórico.
Subimos de volta ao barco, para nos preparar para o segundo mergulho. O guia explica como se portar na arena. Devemos ficar quietos, apenas observando a ação que se passa no centro dela. Nenhum movimento brusco, para não atrair a atenção indesejada dos tubarões em plena hora do lanche. Ele, o guia, se veste com uma tela de aço, pega suas caixas cheias de comida de tubarão e vamos todos para baixo d'água novamente. A gente se coloca em círculo, se segura numa das pedras da arena e assistimos agora a três dúzias de tubarões tentando o seu naco de peixe, às vezes arrancandos da mão do guia. Ficam nadando em círculos, passando literalmente entre nós. Nós não podemos tocá-los, mas eles tem toda a liberdade para nos tocar. Levei algumas barbatanadas, me desviei de outras tantas. O único cuidado que tive foi deixar os dedos da minha mão bem próximos ao corpo. Eram minha única parte descoberta. Fora isso, nenhum medo, nenhum receio. A impressão é a de estarmos em algum filme Imax 3D. Dentro do filme, mas inatingíveis. O que quebra essa sentação são as barbatanadas ("se liga, mané!") ou o frio da água no rosto.
Mergulho com tubarões feito em Nassau - Bahamas
Voltamos para o barco ainda mais fãs desses animais. E a vontade é de ver tubarões ainda maiores. E sei que vamos ver, ainda nesta viagem.
Atravessando de balsa para Ilha Bela - SP
Depois do último e preguiçoso café da manhã na excelente Pousada Katmandu, em Maresias, mais uma vez carregamos a Fiona para colocar o pé na estrada, dessa vez em direção à Ilha Bela, um dos "picos" do litoral norte paulista.
Pousada Katmandu em Maresias, São Sebastião - SP
Antes de pegarmos a balsa em São Sebastião (principal acesso á Ilha, caso não se tenha o próprio barco ou helicóptero), ainda demos uma volta no centro histórico da cidade. Pequeno e charmoso, o mais interessante das cidades do litoral norte. Tínhamos de despachar algo pelo correio, esquecido pela Laura na pousada.
Centro histórico de São Sebastião - SP
O eficiente serviço de balsas nos atravessou em pouco mais de 15 min. A visão da Ilha impressiona, montanhas altas e cobertas por mata densa. Apesar de ser propagada como a maior ilha marítima do Brasil, ela é um pouco menor que Florianópolis. Só que é infinitamente mais bem preservada já que boa parte da sua área é um parque. A ocupação humana se dá basicamente na costa, principalmente na parte que é voltada para o continente.
Atravessando de balsa para Ilha Bela - SP
Reduto dos bacanas de São Paulo, a Ilha é cheia de belas casas, pousadas e restaurantes, muitos com ótima comida e um preço meio salgado. Alguns deles, além da ótima comida oferecem uma vista impressionante. O mar esmeralda e o céu azul que encontramos por aqui contribuem bastante para isso.
Final de tarde na praia do Viana em Ilha Bela - SP
Mas vista espetacular mesmo é a que temos aqui da casa da prima Celina e do Dudu. No alto do morro, quase na ponta norte da ilha, onde o vento faz a curva, a casa ainda está em construção mas alguns quartos já estão prontos e podem receber afortunados hóspedes. A casa foi toda construída para maximizar ao máximo a vista espetacular que oferece. Enormes janelas e portas de vidro se espalham pela casa e seus cômodos. A sensação é de se estar voando sobre o mar. Um espetáculo!
Casa da Celina e Dudu, em fase final de construção, em Ilha Bela - SP
Agora, nos poucos dias que temos por aqui, o mais difícil será escolher entre os diversos programas que a Ilha oferece, de mergulhos à caminhadas, de cachoeiras à praias. Isso sem falar naquilo que a torna mais famosa: os barcos e regatas.
Final de tarde na praia do Viana em Ilha Bela - SP
A imponente estátua em honra ao General Artigas, o maior heroi nacional, na Plaza Independencia, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Chegamos à última capital federal no circuito dos 1000dias por toda a América. Completamos nossa lista de países com o Uruguai e agora completamos a lista de capitais com Montevideo. Quer dizer, na verdade a lista de capitais não ficou assim, tão completa, como a de países. Agora que estamos na capital uruguaia, ficaram faltando a capital venezuelana, Caracas, e a de Turks e Caicos, Cockburn Town, para fecharmos todas as capitais do continente. Em Caracas estivemos, eu e a Ana, dois anos antes de começarmos os 1000dias. Por isso, quando tivemos de escolher, por questões de tempo, entre passar pela capital venezuelana ou conhecermos o sul do país, não titubeamos. As memórias de Caracas ainda estavam frescas na cabeça e até fiz um post de lá (veja aqui). Já a pequena capital de Turks e Caicos, que nem é um país de verdade, mas um território britânico no Caribe, essa deixamos para trás mesmo, preferindo visitar ilhas mais significativas do arquipélago. Faltava, então, a gloriosa Montevideo. Agora não mais!
Caminhando nas ruas do Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Pouca gente se dá conta, mas Montevideo, no Uruguai, é a capital mais austral das Américas, superando Santiago e Buenos Aires
Pouca gente se dá conta, mas Montevideo é a capital mais austral das Américas. Nossa intuição seria apostar nas capitais do Chile ou Argentina, talvez porque é nesses países que estão cidades como Ushuaia e Punta Arenas, ou regiões como a Patagônia e Terra do Fogo. Mas as suas capitais, Santiago e Buenos Aires, estão sim mais ao norte do que a capital uruguaia. Parafraseando aquele ditado famoso, “viajando e aprendendo!”.
O grande portal da Plaza Independencia, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Com os pais, aos pés da estátua de Artigas, na Plaza Independencia, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Outra coisa que aprendi chegando aqui foi que Montevideo também foi fundada por portugueses. Achei que essa “honra” só cabia à Colonia del Sacramento. Mas não. Em Novembro de 1723 os portugueses de Colonia resolveram ampliar seus domínios às margens do Rio da Prata e aqui fundaram um forte. Os espanhóis, que já tinham de aguentar a incômoda presença lusitana em Colonia, resolveram que uma cidade já era demais e não quiseram dar nenhuma chance para que o novo povoado se desenvolvesse. Dois meses depois da construção do forte, uma expedição vinda de Buenos Aires tomou a instalação militar e, eles mesmos, começaram a povoar a nova cidade. Rapidamente Montevideo ganhou importância e ainda nesse século já rivalizava com a própria Buenos Aires como principal cidade espanhola na bacia do Prata. Por um século, desde a sua criação, ela ocupava a península que hoje é conhecida como Ciudad Vieja. Foi apenas depois da rápida ocupação inglesa de 1807 e da ocupação luso-brasileira de 1816-25 que a cidade passou a se expandir além dos antigos muros.
O grande portal da Plaza Independencia, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
As principais atrações turísticas de Montevideo, capital do Uruguai, estão no Centro Velho. Nós ficamos hospedados na vizinhança mais interessante, Pocitos. Em Carrasco, área de classe média alta, há muitos hotéis e uma grande praia
Hoje a cidade cresceu bastante. Das poucas famílias de 1730 para 60 mil pessoas em 1860 para 1,4 milhão nos dias de hoje. Se consideramos a região metropolitana, são 2 milhões de pessoas em um país com 3,3 milhões de habitantes. Relativamente, é como se houvesse uma cidade no Brasil com 120 milhões de pessoas! Mas, apesar de ter crescido tanto, é ainda na Ciudad Vieja, onde nasceu, que estão os principais atrativos turísticos da cidade. E foi para lá que nos encaminhamos hoje para nossas explorações, eu, a Ana e meus pais, que nos acompanham aqui no Uruguai. Nós estamos hospedados na região de Pocitos, a mais gostosa de Montevideo, por onde passeamos ontem, quando meus pais chegaram, e onde também ficaremos amanhã. No próximo post falo de lá, um bairro que tanto nos lembra o Rio de Janeiro de antigamente, no melhor dos sentidos. Mas hoje, queríamos história, e o lugar para isso é mesmo a Ciudad Vieja.
A imponente estátua em honra ao General Artigas, o maior heroi nacional, na Plaza Independencia, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
A imponente estátua em honra ao General Artigas, o maior heroi nacional, na Plaza Independencia, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Fomos com a Fiona até as proximidades da Plaza Independencia, encontramos um estacionamento e partimos para nosso passeio a pé, sem dúvida nenhuma a melhor maneira de se conhecer essa parte da cidade. O passeio começou na própria praça, a mais icônica da capital e onde está uma pomposa estátua do herói maior da nação, o General Artigas. Estátua típica de heróis da independência em qualquer país, sobre um cavalo e em trajes militares. Sob a estátua, o mausoléu em honra ao libertador, com dados e relíquias sobre a sua vida.
Visita ao mausoleu de Artigas, na Plaza Independencia, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Visita ao mausoleu de Artigas, na Plaza Independencia, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Artigas teve uma infância abastada em fazendas da família, mas acabou por se tornar um fora-da-lei que agia com roubo de gado e tendo sua cabeça a prêmio. Mas a guerra entre Espanha e Inglaterra, no contexto das guerras napoleônicas na Europa, possibilitou que ele se incorporasse ao exército e tivesse atuação destacada, tanto para desalojar os britânicos de Buenos Aires como de Montevideo. Poucos anos mais tarde, foi um dos principais líderes na guerra pela independência dos domínios espanhóis na região do Rio da Prata. O problema é que aqueles que lutavam pela independência também estavam divididos entre si, um grupo defendendo um governo forte e central, em Buenos Aires, e outro, no qual se destacava Artigas, que defendia ideias federalistas.
Nosso circuito caminhando pelo Centro Velho de Montevideo, no Uruguai. Fomos às principais atrações, como a Plaza Independencia, o Teatro Solis, a Catedral, a Plaza Zabala e, claro, o Mercado del Puerto
O Teatro Solis, o mais tradicional do país, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Um pomposo lustre ilumina o saguão de entrada do Teatro Solis, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
A facção realista, que lutava por manter os laços com a Espanha e tinham Montevideo como capital, foram vencidos. Artigas era o mais importante líder de uma união de províncias, incluindo aquelas que hoje formam o Uruguai e outras, dentro do território argentino. Preocupados com seu crescente poder, os unitaristas, defensores de um governo central forte, acabaram por fazer uma aliança tácita com os portugueses que ainda controlavam o Brasil. Estes temiam as ideias republicanas de Artigas e com a complacência de Buenos Aires, conquistaram o Uruguai. O grande líder fugiu para o Paraguai e aí viveu exilado pelo resto da vida, nunca mais pisando os pés no Uruguai que havia liberado da Espanha. Rivais e aliados, temendo a aura de liderança de Artigas, se combinaram para que ele nunca mais recuperasse sua influência enquanto estivesse vivo. Nem mesmo na guerra de independência do Uruguai contra o Brasil, dez anos mais tarde, ele seria chamado a participar. Apenas em meados do séc. XIX, pouco tempo após morrer com mais de 80 anos de idade, seu nome foi reabilitado na terra natal e seus restos transladados para o Uruguai. Hoje ele repousa sereno em seu panteão, na Plaza Independencia e, sem nenhuma dúvida, é considerado o grande herói da história do país.
Interior da Catedral Metropolitana, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Visitando a Catedral Metropolitana, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Detalhe do piso da Catedral Metropolitana, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Após essa aula de história, retomamos nosso passeio pela Ciudad Vieja. A próxima parada foi no Teatro Solis, o mais tradicional de Montevideo. O pomposo edifício remonta da metade do séc. XIX, uma época em que a economia local fervilhava com as exportações de carne. Grandes prédios neoclássicos se espalhavam pela cidade e o Solis é um dos mais renomados exemplos. Recentemente, milhões foram investidos para devolver-lhe a antiga glória. Nós só o vimos pelo lado de fora e seu saguão de entrada, mas assistir a algum espetáculo por lá será sempre um bom motivo para voltar a Montevideo.
Visita à tradicional livraria no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Cruzando a movimentada Plaza Zabala, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Continuamos a caminhar e a próxima parada foi em uma livraria tradicional da cidade. Sempre gostamos de visitar livrarias nos países que visitamos, uma boa maneira de perceber a quantas anda a cultura no país. A literatura em espanhol, tanto de obras próprias como as traduzidas de outras línguas como o inglês e francês, é infinitamente mais vasta que a literatura em português. Percebe-se logo isso visitando as livrarias de Buenos Aires ou esta, aqui de Montevideo. Aproveitei para comprar dois livros de história, que tanto gosto, enquanto meu pai comprou um de fotos e textos relatando a visão uruguaia da Copa de 50, daquele fatídico 2 x 1, conhecido como “Maracanazo”. Meu pai esteve presente naquele jogo, então, para ele, é ainda mais interessante (e penoso?) ver a alegria dos jornais uruguaios da época.
Produtos "made in Brasil" a venda no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
quitanda no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Cães aguardam ansiosos por seu dono, em quitanda no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
A fome começava a apertar e nós também apertamos o passo. Passamos rapidamente pela feira que ocupa sempre a simpática Plaza Zabala e nos dirigimos à atração preferida dos brasileiros que visitam a capital uruguaia: o Mercado del Puerto. A cidade está cheia de gremistas que vieram para um jogo da Libertadores e a maioria deles estava no famoso mercado. Aliás, já faz tempo que ele deixou de ser um mercado de verdade e hoje é ocupado apenas por restaurantes.
Visita ao Mercado del Puerto, uma das principais atrações do Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Visita ao Mercado del Puerto, uma das principais atrações do Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Os verdureiros desalojados hoje ocupam as cercanias do prédio histórico. Aí encontramos até mesmo bananas vindas diretamente do Brasil. Mas não eram bananas que procurávamos, mas uma refeição de verdade. Nós e todos os gremistas na cidade. Com o Mercado del Puerto ali em frente, isso não era um problema!
Interior do famoso e imperdível Mercado del Puerto, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Interior do famoso e imperdível Mercado del Puerto, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
O famoso relógio do Mercado del Puerto, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
O prédio tem quase 150 anos e é o primeiro no continente construído sobre uma estrutura de ferro, uma técnica que ainda engatinhava, mesmo na Europa. A Torre Eiffel, por exemplo, só seria construída 20 anos mais tarde, em 1889. Assim que ficou pronto, virou ponto de encontro na capital e por aqui passeavam juntos gente como Carlos Gardel e Enrico Caruso, em busca de um bom café. Hoje, como disse, todas as vendas se foram e o espaço é só dos restaurantes e das centenas de turistas que vem se refestelar com um legítimo e suculento “asado uruguayo”. Foi o que fizemos, programa obrigatório para quem não é vegetariano e vem conhecer a capital do país. Uma delícia! Difícil é só escolher entre a cerveja Patricia e o vinho Tannat, porque as carnes, na dúvida, que venham todas!
Abundância e variedade de carnes nos restaurantes do Mercado del Puerto, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Abundância e variedade de carnes nos restaurantes do Mercado del Puerto, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Almoçando em restaurante do Mercado del Puerto, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Depois do ponto alto e mais nutritivo do dia, começamos a caminhada de volta à Fiona. Voltamos pelas ruas peatonais (para pedestres), aproveitando para admirar a arquitetura dos antigos prédios neoclássicos e também para observar a arte nas ruas, desde murais pintados nas paredes até os artistas se apresentando nas ruas. Dia de semana normal por aqui, também é interessante ver o ritmo normal das pessoas, gente saindo do trabalho na hora do almoço para comer na esquina ou, já perto do final da tarde, alguns bares começarem a se encher para o happy-hour. É aí que nos sentimos menos turistas e um pouco mais “uruguaios”, sensação que perseguimos em todos os países e cidades que visitamos.
Arte nas ruas do Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Música exótica nas ruas do Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Só despertávamos desse “sonho uruguaio” quando cruzávamos com alguma placa celebrando uma vitória militar contra os brasileiros. Por aqui, precisamos nos acostumar com a ideia que nós somos (ou fomos) imperialistas e opressores, ou seja, os bandidos da história. Quando o Brasil se tornou independente de Portugal, nós “herdamos” a Província Cisplatina que os portugueses haviam conquistado de Artigas anos antes. A paz durou pouco e logo Dom Pedro I estava enfrentando uma rebelião aqui no sul, mais uma luta de independência do Uruguai. Foram três anos de batalhas até que as forças brasileiras aceitassem a derrota, em 1828. A Argentina, que ajudou os uruguaios em sua guerra de libertação, sonhava com a anexação, mas aí também, já seria demais. Sob os auspícios da Inglaterra, Brasil e Argentina reconheceram a independência do novo país.
Prédios neoclássicos nas ruas do Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Homenagem à mais famosa batalha na luta de independência do Uruguai contra os imperialistas brasileiros, no Centro Velho de Montevideo, no Uruguai
Mas o nosso imperialismo não terminou por aí. Nem o dos argentinos. Pelas próximas quatro décadas, foram sucessivas intervenções desses dois países na política local, hora apenas por ameaças, hora com ações militares efetivas. Blancos e Colorados, as duas facções políticas locais que disputavam o poder, não hesitavam em pedir ajuda externa contra seus rivais. E Brasil e Argentina brigavam dentro do país para manter suas respectivas “esferas de poder”. Foi apenas com o término da Guerra do Paraguai que os uruguaios ganharam um pouco de sossego e alívio externo.
O belo parque Rodó, em Montevideo, capital do Uruguai
Pedalinhos em lago do Parque Rodó, grande área verde na área entre o centro e Pocitos, em Montevideo, capital do Uruguai
Enfim, nós, os imperialistas de outrora, chegamos de volta à Fiona. Antes de voltarmos à nossa querida Pocitos, ainda deu tempo de dar uma parada no parque Rodó, um dos mais belos da capital. Depois da selva urbana da Ciudad Vieja, passear por seus jardins e bosques foi um merecido descanso mental. Aa lado do lago por onde passeavam pedalinhos, aproveitamos o ar puro e o silêncio, buscando digerir todas as informações de um dia intenso. A noite se aproximava e mais um belo jantar em algum dos muitos restaurantes de nossa vizinhança preferida nos aguardava. Se no almoço havia sido patrícia, agora seria tannat!
Pedalinhos em lago do Parque Rodó, grande área verde na área entre o centro e Pocitos, em Montevideo, capital do Uruguai
Mar da praia de Pajuçara, em Maceió - AL
Chegando em Maceió e lendo sobre a cidade no Guia Quatro Rodas, descubro que há uma ciclovia recém inaugurada entre Pajuçara e Jatiuca, duas das principais praias da cidade. Chegando ao Íbis, nosso hotel na cidade, descubro que ele oferece bicicletas aos hóspedes, para alugar. O Íbis fica no comecinho de Pajuçara. No fim de Jatiuca, está o Hotel Jatiuca, palco da minha primeira grande viagem, há 30 anos!
Passeando de bicicleta pela orla de Maceió - AL
Pronto! Juntando uma coisa com outra com a outra, tínhamos o programa perfeito para hoje: pedalar pela linda orla da cidade. E assim o fizemos!
Já disse isso em outro post, mas não custa repetir. A cor verde do mar daqui é absolutamente impressionante. Inacreditável aos olhos de um mineiro ou uma paranaense, acostumados com os mares do sul e sudeste. Acho que, em termos de cor de mar, é o que temos de mais próximo das ilhas do caribe. A água não é transparente, como em Noronha, Abrolhos ou o mar próximo ao Recife. Mas a cor é demais da conta. As fotos do post mostram um pouco disso.
Jangadas em Maceió - AL
A gente passou ao lado das jangadas que levam turistas às piscinas naturais, bem mais próximas da costa do que as Galés em Maragogi. No verão de 1981, lá se vão 30 anos, meu pai trouxe toda a família para uma temporada no então novinho em folha Hotel Jatiuca. Minha primeira vez fora da região sudeste. Minha primeira viagem de avião com mais de uma hora de duração. Minha primeira vez num grande hotel com a família. Minha primeira visão de uma mar dessa cor. Enfim, guardo essa viagem num lugar especial do coração e da memória. Entre elas, o passeio de jangada até às piscinas.
Hotel Jatiuca em Maceió - AL
Por isso, fiz questão de pedalar até esse hotel. Na época, lembro que era meio afastado da cidade. Hoje não, é praticamente no centro. Foi ótimo revê-lo, memórias voltaram, pude contar bastante coisa para a Ana que, nessa época, ainda crescia no ventre materno, pouco maior do que um feijão.
Admirando o mar de Ponta Verde em Maceió - AL
Na volta, paramos num lounge bar bem agitado, DJ mandando bem na beira da praia. Ali ficamos, nadamos, assistimos ao pôr-do-sol. No mar de águas mornas fiz até uma mini-travessia, empolgado com a visão de grandes bóias no mar.
Saindo do mar depois de uma "travessia" em Ponta Verde, em Maceió - AL
Resumindo, um belo dia que nos abasteceu de boas memórias para nunca mais esquecermos essa bela cidade. E ainda tem a noite...
Sol se pondo em Pajuçara, em Maceió - AL
Quadro exposto no Museu Navajo, no Monument Valley, no Arizona, nos Estados Unidos
Hoje o nosso destino era o famoso Monument Valley, localizado no norte do Arizona, bem no coração da terra dos Navajos, ou “Navajo Country” Essa é a tribo mais numerosa de indígenas americanos da atualidade, com cerca de 300 mil membros, língua e cultura próprias e um território que se estende por três estados americanos. Além do Arizona, o Navajo Country também incorpora áreas do Novo México e Utah, além da famosa fronteira quádrupla, ou “Four Courners”, ponto imaginário onde se encontram esses três estados e também o Colorado.
Monument Valley, no Arizona, nos Estados Unidos
Ao visitar o Monument Valley hoje, fizemos uma interessante parada no Museu da Nação Navajo. É ali que se compra o ingresso para visitar o Monument Valley, que é gerido pelos Navajos, já que se localiza em território sagrado para a tribo, local ancestral que os Navajos tèm ocupado e venerado por centenas de anos. Não foi o nosso primeiro contato com essa etnia, mas certamente o mais esclarecedor. Já tínhamos dormido em um dos mais importantes trading posts dos Navajo, na saída do Grand Canyon. Depois, ao viajar entre Arizona e Utah, dirigimos por horas através de sua reserva e de paisagens belíssimas. Mas era só agora que tínhamos a oportunidade e tempo de aprender um pouco mais da história sofrida desse povo.
Mapa da Nação Navajo, em quadro exposto no Museu Navajo, no Monument Valley, no Arizona, nos Estados Unidos
Registros arqueológicos e estudos linguísticos indicam que os Navajo chegaram à região há cerca de 600 anos, vindos do noroeste da América do Norte. Chegaram como um povo nômade, mas o contato com os pueblos (vamos conhecer melhor essa cultura no Mesa Verde National Park, amanhã) os transformaram em um povo agricultor, principalmente de feijão e milho. Com a chegada dos espanhóis no México e o crescimento do comércio, agora os Navajo passaram a ser grandes criadores de cabras e ovelhas, assim como hábeis artesãos de algodão e lã.
Rain God Mesa, no centro do Monument Valley, no Arizona, nos Estados Unidos
Infelizmente, nem só de comércio se dava o “choque de civilizações”. Ao contrário, a principal faceta dessa relação era a guerra. Primeiro, contra os espanhóis, depois com os mexicanos e, por fim, com os novos senhores daquelas terras, os americanos. Enquanto com os dois primeiros, houve um certo equilíbrio de forças, com perdas e massacres para ambos os lados, contra os americanos e sua onda ocupatória e expansionista, o povo Navajo não resistiu mais de duas décadas. Novos colonos não paravam de chegar e, atrás deles, a cavalaria americana. Em 1863, os últimos bandos de Navajos foram derrotados e toda a etnia completamente subjugada. O que se seguiu foi um dos mais tristes capítulos da ocupação do oeste americano, a chamada “Long Walk”, ou longa marcha, em que 9.000 mil índios Navajo, a maioria mulheres e crianças, foram expulsos de suas terras ancestrais e obrigadas a caminhar cerca de 500 quilômetros até sua nova reserva, no Novo México. Foi um massacre, tanto a caminhada como o período em que ficaram em sua nova reserva, centenas deles sucumbindo à doenças e à fome generalizada. Por fim, quatro anos mais tarde, foi-lhes permitido retornar para uma área próxima do Monument Valley e, com o tempo, voltaram para cá também. Apesar de toda a área ser transformada em uma reserva, os conflitos com rancheiros e empresas de mineração continuaram por décadas, até quase a metade do século XX.
As belas paisagens do Monument Valley, no Arizona, nos Estados Unidos
A situação melhorou um pouco com a importante participação Navajo na 2ª Guerra Mundial. Os índios empregados no exército desenvolveram um código que jamais seria quebrado pelas forças japonesas. Imagina... se navajo já é difícil, imagina navajo em código! Os japoneses não tinham a menor chance. Com isso, as diversas divisões do exército podiam se comunicar por rádio e telex sem que suas mensagens fossem quebradas, Em cada regimento, um navajo para poder fazer a transcrição das mensagens!
Participação dos navajos na 2a Guerra Mundial, em quadro exposto no Museu Navajo, no Monument Valley, no Arizona, nos Estados Unidos
Hoje, eles são os senhores dessa terra, com seu próprio governo e até polícia. A língua e a cultura são valorizadas e um conselho tenta conciliar as ricas tradições com as exigências da sociedade moderna. As cicatrizes da opressão a que foram submetidos ainda estão aí, mas nenhuma sociedade pode sobreviver olhando apenas para o passado. Esse, claro, não pode ser esquecido, e é essa a função do museu que visitamos hoje. Mas são os desafios do século XXI e como dar oportunidade à nova geração que está crescendo, sem deixar que sejam navajos, mas ao mesmo tempo não fiquem presos ao passado que é a grande questão que se coloca. Para os Navajo, para os Maori, para os Guaranis ou para os Bosquímonos...
Carro de polícia da Nação Navajo, no Monument Valley, no Arizona, nos Estados Unidos
A bela iluminação noturna de Guanajuato, no México
A cidade de Guanajuato começou como muitas outras no México: fundada por colonizadores espanhóis logo no início da ocupação, teve de enfrentar alguns ataques indígenas, mas logo se impôs sobre a população local. O que a fez diferente veio um tempo depois. A descoberta de ouro e, mais tarde, prata, mudou para sempre a história da cidade.
Jardin de La Unión, a praça mais movimentada de Guanajuato, no México
As minas de prata se mostraram “inesgotáveis” e, durante algum tempo no séc XVIII, quase três quartos da produção mundial do metal vinham dessa pequena cidade aqui no México. As pessoas vinham do outro lado do mundo em busca da sua parte do quinhão e a cidade, espremida entre as montanhas, teve de crescer encosta acima. As ruas e ruelas são, ainda hoje, muito mais uma sequência de escadarias do que ruas propriamente ditas. Sendo assim, nem precisavam ser muito largas, já que eram destinadas apenas à pedestres. Em muitas dessas passagens, as varandas opostas quase se tocam, como no famoso “Callejon del Beso”.
Venda de frutas nas ruas de Guanajuato, no México
As ruas mais largas ficaram no fundo do estreito vale, onde a cidade nasceu e onde estão os maiores prédios públicos, praças e igrejas. Com o dinheiro gerado por séculos de exploração da prata, muito se construiu, com pompa e circunstância, prédios de arquitetura refinada e com qualidade para resistir aos séculos. Caminhar por essas ruas hoje é um prazer, olhos sempre virados para cima, admirando a arquitetura colonial impecável dos grandes prédios e também a arquitetura colorida que acabou por se transformar numa das marcas da cidade, as charmosas casas pintadas de azul, rosa, amarelo e outras cores e ainda repleta de vasos de flores pendurados em suas varandas. Enfim, um deleite visual.
Arquitetura colorida, típica em Guanajuato, no México
Outra coisa que chama logo a atenção é a vida que existe na cidade. As ruas principais estão sempre cheias de gente, locais e turistas. Bares e restaurantes oferecem boa comida e boa música, ou apenas um lugar para se sentar e saborear um chá ou cerveja gelada enquanto se observa o mundo passar à sua volta. Difícil mesmo é escolher aonde fazer essas “paradas estratégicas”, já que eles estão por toda parte, nas praças ensolaradas ou sombreadas, nas ruas estreitas e charmosas, nos terraços com vista privilegiada. Ó, dúvida cruel!
Adeus, barba e cabelo! (em barbearia tradicional de Guanajuato, no México)
A exploração de prata acabou, mas o know-how em escavar foi utilizado também para se criar uma vasta rede de túneis sob o solo da cidade. Com isso, boa parte do trânsito fica lá embaixo e não incomoda os pedestres, ao mesmo tempo em que evita congestionamentos para os motoristas. Que magnífica solução! Além disso, os túneis são uma atração à parte, pois foram escavados à mão e não por máquinas e isso é bem claro por sua aparência rústica. Dirigir ou caminhar por eles é infinitamente mais interessante do que fazer o mesmo nos modernos túneis das grandes cidades e estradas.
Chegando ao Cristo Rey, monumento no alto do Cerro do Cubilete, próximo à Guanajuato, no México
A primeira metade do nosso dia de hoje foi de explorações por essa cidade encantada. Na verdade, eu comecei um pouco mais cedo, indo diretamente a uma barbearia. Chega da minha barba cubana! De agora em diante, cara limpa! Pelo menos até passar pela fronteira americana, hehehe! Depois, aí sim, nosso negócio foi caminhar para lá e para cá, tanto nas ruas movimentadas do centro, com suas praças e monumentos, como pelas tranquilas e labirínticas ladeiras e escadarias que sobem as encostas. É onde a cidade fica ainda mais charmosa!
De cara limpa no alto do Cristo Rey, região de Guanajuato, no México
Depois, já de tarde e na companhia do nosso guia e amigo (mais amigo do que guia!) Ricardo, fomos de carro para uma das grandes atrações da região. É a estátua do Cristo Rey, construída sobre uma montanha que muitos dizem ser o exato centro geográfico do país. Talvez por isso atraia tanta gente, centenas ou milhares por dia, a maioria de peregrinos mexicanos. A vista lá de cima é magnífica, podendo de observar quilômetros e quilômetros de paisagens e montanhas para qualquer lado que se olhe, as cidades minúsculas dentro daquela grandiosidade toda.
Cristo Rey em reforma para a visita do Papa à Guanajuato, no México
Muitos peregrinos e visitantes no Cristo Rey, região de Guanajuato, no México
A estátua está em reforma para poder receber um ilustre visitante que chegará no final do mês: o Papa! Pois é, esse ilustre senhor está seguindo os nossos passos. Passará por Cuba e, de lá, virá ao México, especificamente à charmosa Guanajuato, onde dormirá em um dos maravilhosos mosteiros da cidade. Essa sua viagem está mobilizando as enormes multidões católicas do país e os centros de peregrinação mexicanos estão mais movimentados do que nunca. Aqui no Cristo Rey, por exemplo, as pessoas vem de longe em gigantescas caravanas de ônibus e dormem por aqui mesmo, acampados sobre os braços da bela estátua em reforma. Como já notei em outro post, a cada dia me impressiono com a força que a fé católica tem neste país. Por aqui, os evangélicos ainda não encontraram seu espaço...
Fotografando o pôr-do-sol na volta do Cristo Rey para Guanajuato, no México
Observando o fim de tarde em Guanajuato, no México, do alto da abóboda de uma pequena igreja
Voltamos para a cidade e o Ricardo nos levou para uma pequena igreja no alto de um dos morros que cercam Guanajuato de onde tivemos um mirante estratégico para observar o início da noite, as luzes se acendendo e uma lua cheia sensacional se levantando no horizonte, por detrás das montanhas. Foi espetacular!
A famosa "Callejón del Beso", em Guanajuato, no México
Voltamos ao hotel da Fiona, nos separamos do nosso amigo (vamos reencontrá-lo amanhã para assistir à prova de rally) e voltamos caminhando para o centro. Depois de uma parada estratégica numa venda para comprar uma deliciosa “fresa com crema” da vizinha Irapuato, levei a Ana pelas ruas e ladeiras labirínticas que tinha visitado só pela manhã. Começamos pelo famoso Callejon del Beso.
As varandas quase se tocam no famoso "Callejón del Beso", em Guanajuato, no México
O nome vem de uma bonita história/lenda, versão local da universal Romeu e Julieta. Moça rica apaixonada por mineiro pobre, namoro proibido pela família. Mas o inteligente mineiro não se fez de rogado! Conseguiu alugar secretamente a casa em frente à da família da amada. Os amantes se encontravam de madrugada, cada um em sua varanda. A ruela é tão estreita que as varandas quase se tocam. Quem se tocava mesmo eram os pombinhos apaixonados. E de tanto se tocarem, acabaram descobertos e delatados. O fim da história, como não poderia deixar de ser, foi trágico, a donzela apunhalada pelo próprio pai.
Rua deserta na noite de Guanajuato, no México
De baixo das mesmíssimas varandas, nós demos o tradicional beijo, obrigatório para os casais que visitam a cidade. Beijo sem tragédia, claro! E seguimos ladeira acima pelas ruelas desertas e centenárias da cidade alta. Já sabedor do caminho, guiei a Ana com desenvoltura até voltarmos à cidade baixa, já ao lado do Jardin de La Unión, a principal praça de Guanajuato, a duas quadras do nosso hostal.
A magnífica colunata do principal teatro de Guanajuato, no México
Aí do lado está o principal teatro da cidade e, bem em frente, um grande grupo de turistas esperava o início de uma “callejonata”, ou serenata pelas ruas do centro histórico. A performance é feita por um grupo de artistas vestidos a caráter e a Ana, logicamente, quis seguir com eles. Eu, depois de um dia de explorações, voltei para o hotel para trabalhar um pouco e esperar pelas fotos e relatos do evento da minha querida e social esposa.
Público reunido para assistir a "callejonata" em Guanajuato, no México
Amanhã, mais um dia de explorações por aqui e, de noite, o evento que está mobilizando a cidade: a etapa do campeonato mundial de rally.
"Callejonata" segue pelas ruas de Guanajuato, no México
"Por milhares de anos, provavelmente, as pinturas do Lajedo permaneceram intactas, perenes e mudas testemunhas de uma cultura desaparecida; símbolos de rituais, de sobrevivência, de árduas lutas; representações da mentalidade, das esperanças e dos sonhos de grupos humanos há muito desaparecidos na amplidão do tempo.
Habitantes de um mundo sem divisões políticas, suas pinturas estão repletas de sentido universal, memórias atávicas de todos os homens, herança de nossa ancestralidade".
Pinturas rupestres no Lajedo da Soledade, região de Apodi - RN
Estivemos hoje, no caminho entre Galinhos e Mossoró, no Lajedo da Soledade, próximo à cidade de Apodi, interior do Rio Grande do Norte, quase fronteira com Ceará. É mais uma região onde se encontram fósseis de animais pré-históricos, principalmente da megafauna, como preguiças gigantes e trigres dente-de-sabre, e pinturas rupestres com milhares de anos de idade, deixadas por paleoíndios há muito desaparecidos. Logo na entrada do parque há um museu bem informativo. E na entrada do museu, um texto que eu gostei muito, do qual reproduzo alguns trechos mais marcantes, e para mim muito significativos, no início e no final deste post.
Com a Ana, da pousada Ilha do Pisassal, em Galinhos - RN
Antes de lá chegar, tivemos de deixar a tranquila Galinhos. Despedimo-nos da simpática Ana, da Pousada Ilha do Pisassal, que tinha nos recebido tão bem e que se esmeirava em nos fazer bem alimentados no café da manhã e tomamos o barco de volta a Pratagi, onde estava a nossa Fiona. Mais uma vez, deliciosas reminiscências da Ilha do Mel.
A caminho do barco para deixar Galinhos - RN
No barco com toda a nossa bagagem dos dois dias em Galinhos - RN
A estrada para o interior cortou uma enorme área de exploração de petróleo. A própria estrada é obra da Petrobrás. Aos poucos, vamos nos acostumando com a exótica figura de bombas de petróleo instaladas no meio da caatinga. O Rio Grande do Norte é o maior produtor de óleo em terra do Brasil.
Lajedo da Soledade, em Soledade, região de Apodi - RN
Passamos por Apodi e fomos direto ao distrito de Soledade. Lá, já no museu, nos providenciaram um guia, o Cézar, para nos levar ao Lajedo. Um grande campo de rochas caucárias formado sob o mar que há muito recuou, deixando as rochas e sedimentos sobre o efeito das intempéries. O resultado foi que vários canais, pequenos canyons, se formaram nas rochas. Esses canais formam pequenas tocas que serviam de abrigo aos habitantes de outrora. Eles se aproveitavam do teto, das paredes e mesmo do piso para deixar suas marcas.
O Cézar nos mostra o Lajedo da Soledade, região de Apodi - RN
O resultado é um tesouro arqueológico, belas pinturas rupestres que nos contam um pouco a história desse povo e nos faz tentar imaginar quem eram e como viviam. A região já era seca e quente e, provavelmente, só era usada nos meses de chuva por esse povo de características nômades. Ali faziam seus rituais e representavam seus sonhos e angústias. Essas pinturas acabaram por perpetuá-los (pelo menos até hoje!), uma ligação direta com um passado que já teria desaparecido por completo, não fosse por essas incríveis pinturas.
Pintura de lagarto no teto de uma toca bem baixa no Lajedo da Soledade, região de Apodi - RN
São formas geométricas, calendários e contagens. São figuras humanas e também de animais, maravilhosamente representados. Há uma arara que é uma obra de arte! Muitas figuras de mãos que denotam que esse povo deveria ser de pequena estatura, prova de uma vida difícil com poucos alimentos.
A bela pintura da Arara, no Lajedo da Soledade, região de Apodi - RN
Ali do lado há outro sítio, chamado Olho d'Água, uma espécie de armadilha para animais. Eles íam ali beber água, caíam na piscina e de lá não saíam. Azar deles, sorte nossa! Acabaram virando fósseis e hoje podem ser estudados por nós. Gigantescos animais que um dia dominaram essa região. Pelo porte, são prova inequívoca que o sertão já foi muito mais úmido, com uma vegetação muito mais densa.
Observando o Olho d'Água, local onde foram encontrados muitos fósseis no Lajedo da Soledade, região de Apodi - RN
Puxa... quando é que vão inventar a máquina do tempo? Eu não pensaria duas vezes em trocar os nossos 1000dias pela América por 1000dias pelos últimos 100 mil anos...
Explorando toca no Lajedo da Soledade, região de Apodi - RN
Fileira de pássaros voando em direção ao sol, pintura rupestre no Lajedo da Soledade, região de Apodi - RN
Há uma mensagem nas ravinas coloridas de pinturas. Uma mensagem de outra época, de outros homens que, no ato de se perpetuarem, parecem gritar, maravilhosamente humanos: "Estivemos aqui! Cuidem de nós!"
Painel mostrando os conquistadores espanhóis explorando os indígenas pintado por Diego Rivera no Palácio do Governo, na Cidade do México, capital do país
Hoje a manhã começou com novas “burocracias”. Por e-mail, descobri que nosso querido consulado brasileiro nada pode (ou deseja) fazer para me ajudar na questão do imbróglio de nomes e sobrenomes no meu passaporte e no visto mexicano. O negócio é passar na raça mesmo, quando estivermos voltando de Cuba. O bom senso há de prevalecer! Quanto ao consulado, lá na Guiana Francesa eles também não ajudaram. Espero que a ajuda deles não seja, algum dia, fundamental. Até agora, ainda bem, sempre pudemos resolver de outra maneira... Também encomendamos com o Rafa, que vai nos encontrar em Cuba, peças para as revisões da nossa Fiona, aqui na América do Norte. Por ser a diesel, e aqui só há Hilux gasolina, não se encontra filtros de combustível e de óleo para ela. Especialmente esse último, deve ser trocado a cada 10 mil km. Achei que só teríamos este problema nos EUA, mas aqui no México já é assim também.
A enorme Catedral da Cidade do México, capital do país
Depois, táxi para a Zócalo, praça central da Cidade do México. Uma das maiores praças do mundo, um enorme espaço vazio cercado de prédios monumentais. Quem logo chama a atenção é a vistosa Catedral Metropolitana. Enorme também, com mais de 60 metros de altura, a construção demorou séculos para terminar. Com isso, são as mais diversas as suas características arquitetônicas, dependendo do arquiteto ou da geração em que aquela parte da construção estava sendo feita. Outra coisa que logo notamos é que o prédio e suas torres estão bem inclinadas. Junto com toda a parte central da cidade, a catedral está afundando aos poucos no solo poroso do antigo lago que ocupava a região. Tem até um gigantesco pêndulo pendurado no alto da cúpula da catedral que nos mostra o quanto o prédio já se “movimentou” desde a sua construção.
Passeando na enorme Catedral da Cidade do México, capital do país
A Catedral e o Palácio do Governo na Zócalo, praça central da Cidade do México, capital do país
Outro prédio monumental na praça é o Palácio Governamental. Parte aberto a visitação pública, parte ainda usado pelo próprio presidente do país. Impressionante por fora, belíssimo por dentro. Aí estão os famosos e enormes murais de Diego Rivera, o mais importante pintor mexicano. São mais de dez deles, cobrindo paredes inteiras, mostrando aspectos e cenas da história do país, desde o período indígena até a revolução mexicana do início do século passado. Para mim, os mais interessantes são os que mostram a época asteca e o encontro fatídico com os espanhóis. Interessante também são aqueles que glorificam “Carlos Marx”, não deixando dúvidas qual eram as tendências políticas do autor dos murais.
Gigantesco e incrível mural pintado por Diego Rivera no Palácio do Governo, na Cidade do México, capital do país
Painel pintado pelo socialista Diego Rivera no Palácio do Governo, na Cidade do México, capital do país
Depois de visitarmos várias salas suntuosas do Palácio onde se passaram alguns dos mais importantes eventos da história mexicana, seguimos para outro prédio ali do lado da praça, um dos que eu mais estava interessado. Na verdade, ruínas de um antigo prédio: o Templo Maior de Tenochtitlán.
Maquete de Tenochtitlán, a capital asteca, no Museu Nacional de Antropologia, na Cidade do México, capital do país
Não é de hoje que a Cidade do México é uma das maiores cidades do mundo. Essa “tradição” vem de longe, de antes de Colombo chegar à América. Nesta época, a cidade tinha o difícil nome de Tenochtitlán e era a capital de um vasto e poderoso império. Enquanto os espanhóis ainda se ocupavam de conquistar as ilhas caribenhas e dizimar suas respectivas populações, nas primeiras décadas do séc. XVI, aqui no México eram os astecas que ampliavam seus domínios, chegando a mais de 1000 km de distância de sua capital, ainda completamente ignorantes de que o maior perigo estava logo ali, bem do lado.
Visitando o Palácio do Governo, na Cidade do México, capital do país
Pois os espanhóis finalmente chegaram ao continente e logo ficaram sabendo do rico e poderoso império que existia por ali. Numa épica jornada, Hernán Cortés conduziu seus pouco mais de 500 “conquistadores” através de terrenos desconhecidos até a capital dos astecas. Lá, ficaram completamente boquiabertos com o que viram, uma cidade muito maior do que qualquer uma que havia na Espanha, naquela época. Cerca de 250 mil pessoas viviam em uma ilha no meio de um lago, enormes templos e pirâmides marcando não só o centro da cidade, mas também do universo (é, os caras não eram modestos...). Cortés relata que entre seus homes havia pessoas que conheciam as maiores cidades da época, como Constantinopla ou cidades da Índia. E não houve que não se abismasse com o que via ali, tanta glória e riqueza juntas. Poucas vezes na história da humanidade houve um encontro como esse, de duas culturas tão fortes, tão distintas e completamente surpresas pela existência da uma da outra.
Ruínas do templo Maior de Tenochtitlán, na Cidade do México, capital do país
O fato é que cerca de um ano depois desse encontro, o outrora poderoso império asteca estava dizimado, de joelhos, batido e vencido por essas poucas centenas de conquistadores. Várias são as razões desse desfecho tão trágico para os astecas. O gênio de Cortés, que soube aproveitar ao máximo as oportunidades que o destino lhe conferiu e a personalidade titubeante e fraca do imperador Montezuma II, líder dos astecas, certamente foram decisivas na história. Quis o destino que Cortés chegasse ao México justamente no ano em que antigas previsões e lendas astecas dizam que retornaria à região, vindo exatamente do oriente, o antigo deus tolteca Quetzacoatl, para reconquistar o que tinha sido seu. Além disso, a imagem do deus, de barba, se assemelhava à do próprio Cortés. Essa semelhança fez com que o místico Montezuma temesse enfrentá-lo, permitindo que Cortés ganhasse um tempo valioso não só para entender aquele novo mundo que estava conhecendo, mas também para formar uma grande rede de alianças com tribos e povos que odiavam os despóticos astecas. Esses, coitados, mal sabiam que estavam trocando o diabo pelo capeta...
Visitando as ruínas do Templo Maior dos astecas, na Cidade do México, capital do país
A tecnologia de guerra espanhola era infinitamente superior. Os povos pré-hispânicos não usavam o metal e suas armas pouco podiam contra as pesadas espadas e armaduras espanholas. Além disso, nunca tinham visto cavalos e o seu uso nas batalhas era avassalador, colocando os indígenas em fuga. A enorme superioridade numérica foi sendo perdida aos poucos, já que os espanhóis angariaram milhares de aliados. Na batalha final por Tenochtitlán, já seriam 200 mil indígenas sob o comado de cerca de mil espanhóis.
O prédio das Caveiras, no Templo Maior dos astecas, na Cidade do México, capital do país
Mas, não resta dúvida, o maior soldado em prol dos espanhóis foram as doenças trazidas do velho mundo. A varíola simplesmente destroçou a população das Américas. Somente no México, de uma população indígena estimada em 20 milhões no início do séc. XVI, apenas um milhão sobrava no início do século seguinte. Guerras e escravidão contribuíram com esse declínio, mas foi a morte por doenças e o completo desarranjo que causou às antigas sociedades e modos de vida, resultando em queda de produção agrícola e fome generalizada o principal culpado do mais mortífero século da história da humanidade.
Painel mostra como grande parte do Templo Maior está abaixo da Catedral da Cidade do México, capital do país
Lendo a história, observando as ruínas, vendo de tão perto os apetrechos dessa antiga civilização que ruiu literalmente de um dia para o outro, é difícil não se simpatizar com eles, torcer para que o resultado tivesse sido outro, querer voltar no tempo para prepará-los para este encontro, levar alguns cavalos, armaduras, espadas e vacinas para aquela época. Como teria sido a história da América se os europeus não tivessem chegado aqui? Incas e astecas eventualmente se encontrariam e se enfrentariam?
Crânio encontrado nas ruínas do Templo Maior dos astecas, na Cidade do México, capital do país
Bom, os astecas também não eram os “mocinhos” da história. Tinham uma sociedade altamente militarizada, baseada na conquista e posterior tributação dos povos conquistados. Eram simplesmente odiados pela maneira tirânica como governavam. Um dos aspectos que mais chamam nossa atenção é a verdadeira cultura dos sacrifícios humanos. O que mayas e outros povos faziam eventualmente, eles faziam diariamente. Durante a época de festivais eram centenas ao dia. O coração arrancado do corpo ainda vivo, ainda chegava a bater na mão do sacerdote. Dentro do seu vasto império, eles tiveram o cuidado de “não conquistar” três ou quatro pequenas áreas, exatamente para poderem fazer guerra sempre que precisassem de novas vítimas. Aliás, esse costume de querer capturar vivos (para posterior sacrifício) os oponentes, ao invés de mata-los no campo de batalha, também os atrapalhou bastante na guerra contra os espanhóis. Não obstante, cerca de 70 ibéricos foram sim sacrificados, aos gritos, nos altares astecas.
Estátua de guerreiro vestido de águia encontrada nas ruínas do Templo Maior dos astecas, na Cidade do México, capital do país
Impossível para nós julgar com isenção toda uma cultura baseado, mesmo inconscientemente, numa ética cristã que já nos é intrínseca, e que é completamente alienígena àquele povo. Mas admirar a sua arquitetura, a sua arte, a sua cultura e a organização de seu império e sociedade, isso não é difícil. As “testemunhas” estão ali, na nossa frente, nos museus e nas ruínas do Templo Maior.
Enorme escultura colorida de deusa asteca encontrada nas ruínas do Templo Maior dos astecas, na Cidade do México, capital do país
Falando nisso, e voltando à conquista espanhola, após a queda de Tenochtitlán e à indigna tortura do último imperador asteca para que dissesse aonde estava o ouro (e ele não falou!), os espanhóis e seus aliados indígenas destruíram completamente a cidade. Sobre ela, fundaram uma nova, a capital da Nova Espanha, a Cidade do México. Os gigantescos templos estacas foram desmontados e, com suas pedras, a praça e suas construções foram pavimentadas. A Catedral foi construída justamente encima de onde estava a maior parte do Templo Maior. O intuito foi destruir completamente os vestígios da antiga cultura para ser substituída pela outra. Como já disse em outro post, todos os documentos escritos no idioma nahuatl (a língua asteca) eram queimados como obras do demônio. Felizmente, alguns poucos escaparam, assim como pessoas da época, especialmente frades, nos deixaram documentos e relatos sobre a sociedade asteca. E, num acaso do destino, numa obra de remodelação da praça, foram redescobertos vestígios do Templo há muito esquecidos e, desde então, novas pesquisas e escavações vem sendo feitas, revelando mais e mais sobre esta fantástica civilização.
Painel com cenas astecas pintado por Diego Rivera no Palácio do Governo, na Cidade do México, capital do país
Bom, e nós, depois desse banho asteca, felizmente sem sacrifícios humanos, voltamos para nossa casa na capital mexicana. Amanhã, retorno ao Caribe. E daqui a um mês, voltamos à Cidade do México para mais alguns dias de explorações nessa que é não apenas uma cidade, mas um verdadeiro universo (mas não o centro dele!!!) de informações e atrações que apenas começamos a arranhar...
Uma enorme bandeira tremula no centro da Zócalo, principal praça da Cidade do México, capital do país
Visão do centro histórico de Ouro Preto - MG
Deixamos a Pousada da Serrinha depois de sermos muito bem tratados pela Cris e seguimos para a vizinha Ouro Preto, a cidade mais rica e movimentada do Brasil e do continente durante todo o séc. XVIII. Não é à tôa que tinha o nome de Vila Rica.
Pousada da Serrinha, em Mariana - MG, com a Cris
No finalzinho do século anterior, por volta de 1695, foi descoberto ouro em grandes quantidades em um dos rios da região. Era a tão esperada notícia por Portugal por quase 200 anos! Antes tarde do que nunca. Em pouquíssimo tempo a notícia se espalhou pelo reino, pela colônia e até para outros países, atraindo aventureiros em busca de riqueza rápida de todos os cantos. A situação foi tal que a colônia ficou despovoada em outros lugares e superpovoada na região de Vila Rica. Também de Portugal vieram dezenas de milhares de pessoas. Esse rápido e forte fluxo migratório para uma região sem a menor infraestrutura fez com que pessoas com bolsos abarrotados de ouro morressem de fome, já que simplesmente não havia alimentos para todos. Causou também a Guerra dos Emboabas, entre paulistas e portuguêses, todos disputando os melhores pontos de lavras e garimpos. Minas virou uma terra sem lei onde valia a lei do mais forte. Muito pior que o faroeste americano de cem anos mais tarde.
Uma das igrejas em Ouro Preto - MG, com o Pico do Itacolomi ao fundo
Aos poucos, o Estado foi ocupando seus espaços, organizando a produção e, principamente, coletando seus impostos. O ouro extraído de Minas sustentou Portugal pelo século seguinte, causou uma inflação mundial e foi parar no bolso da burquesia inglêsa, abrindo caminho para a revolução industrial.
A famosa igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto - MG
Aqui no Brasil, e principalmente nas cidades da região, toda essa riqueza ajudou a construir belas igrejas e criar e fortalecer uma classe média ávida por cultura e liberdade. Escolas foram criadas, assim como teatros e obras de infraestrutura.
Detalhe da fachada da igraja de S. Francisco de Assis, obra de Aleijadinho, em Ouro Preto - MG
O ouro acabou, o Brasil ganhou sua independência e Ouro Preto entrou em lento processo de decadência. Uma decadência meio charmosa, eu diria, Continuou a atrair escritores, estudantes, poetas e outros boêmios. Tinha uma vida vibrante cem anos após o fim do ciclo do ouro e ainda hoje é conhecida pelas suas festas e repúblicas de estudantes. E, claro, pelo patrimônio cultural e arquitetônico que abriga.
As famosas "repúblicas" de Ouro Preto - MG
Foi essa Ouro Preto que eu fui passear com a Ana. Igrejas, ladeiras, largos e o delicioso restaurante do Passo onde almoçamos como reis, atrasando nossa saída para Tiradentes. A viagem que era para ser feita de dia, foi quase toda de noite mesmo.
Cerveja Teresópolis, em Ouro Preto - MG
Sempre que visito Ouro Preto, ou a saudosa Vila Rica, desde os tempos em que lá estive numa festa do Doze (festa anual realizada em 12 de Outubro), presto homenagem a um parente longíncuo. Acho que seu nome era Pedro. Era o irmão mais velho do meu bisavô e primogênito do meu abastado trisavô. Foi para Ouro Preto em fins do séc XIX, estudar. Época áurea da terceira fase do romantismo, quando a boemia era valorizada ao máximo. A cidade era um celeiro de poetas. Imagino a vida que teve por ali. Deve ter sido intensa. Terminou como a maioria dos poetas daquela época, pego pela combinação fatal da tuberculose com a boemia. Fico só imaginando a Vila Rica daqueles dias...
Admirando Ouro Preto - MG
As famosas "Bruxas de Salem", em Massachusetts, nos Estados Unidos
Conforme temíamos, mas já esperávamos, a bateria da Fiona estava outra vez arriada, hoje de manhã. Outra vez também, nosso cabo de chupeta nos salvou, assim como a simpatia dos americanos, que prontamente emprestam seus carros para conseguirmos ligar a Fiona. A bruxa realmente estava solta. Depois de quase 90 mil km pelas Américas, finalmente tivemos nosso primeiro problema no carro (sem contar os pneus furados).
Portland, em Maine, nos Estados Unidos
Então, com o carro já ligado e carregado das malas, deixei a Ana e a Bebel no centro de Portland e segui para uma concessionária Toyota, na região da cidade. Como sempre, o carro fez o maior sucesso na loja, todos os vendedores e funcionários muito interessados naquela Toyota que veio do Brasil, funciona à diesel e é equipada com snorkel e guincho. Examinaram rapidamente a bateria e concluíram: “Não tem jeito. Uma das células não carrega mais. Tem de trocar!”. E assim foi feito, Fiona de bateria nova, garantia de 4 anos, nos EUA e Canadá.
Lagosta, especialidade em Portland, no Maine, nos Estados Unidos
Com o carro novo em folha e pronto para cruzar o continente outras vez, fui encontrar esposa e afilhada no centro da cidade. Ainda deu tempo de eu dar uma andadinha por lá e tomar um delicioso frozen iogurt de morango, um verdadeiro deleite no calor abafado de mais de 30 graus que fazia na cidade. A Ana e a Bebel me contaram sobre o passeio na região do porto e o restaurante japonês em que almoçaram. Um pouco depois e já estávamos na estrada rumo à Boston, a cidade que já quero conhecer há quase 30 anos.
Delicioso Frozen Iogurt em Portland, em Maine, nos Estados Unidos. O merecido prêmio depois de consertar a Fiona
Bom, na verdade, eu ainda teria de esperar mais um pouco. Afinal, antes de Boston, ainda resolvemos passar em Salem, a famosa cidade das bruxas.
Visita à Salem, em Massachusetts, nos Estados Unidos
Pois é, em Salem se passou uma das histórias mais inacreditáveis da época da colonização dos Estados Unidos. Os peregrinos haviam chegado há apenas três gerações no novo continente e os colonizadores ainda levavam uma vida duríssima. Mas, seguindo a tradição inglesa, era uma sociedade que vivia sob o império da lei, num mundo relativamente racional, mesmo para os nossos padrões do século XXI.
O Museu das Bruxas de Salem, em Massachusetts, nos Estados Unidos
Mas aí, na pequena e pacata Salem, um pouco ao norte da capital Boston, a jovem Abigail, garota de 11 anos de idade, começou a ter sintomas que hoje classificaríamos como de epilepsia. Logo depois, foi sua prima de 9 anos, Betty Paris, que também teve o mesmo comportamento. O doutor da cidade, ao examiná-las, não conseguiu identificar nenhuma causa médica para isso e resolvei dizer que, talvez, elas estivessem sob o efeito de bruxaria.
Visita ao Museu das Bruxas de Salem, em Massachusetts, nos Estados Unidos
Foi a fagulha que deu início ao incêndio. Nunca na história do continente, a expressão “caça às bruxas” foi tão literal. Aliás, o mais provável é que a expressão tenha nascido desse episódio. Várias possíveis “bruxas” foram identificadas na cidade e as crianças parecem ter gostado da brincadeira, pois eram as primeiras a apontar as pobres velhinhas que viviam na vizinhança. Quando a primeira delas foi julgada e os jurados decidiram pela inocência (a racionalidade ainda imperava...), as crianças, que até então estavam mudas no julgamento, tiveram um ataque histérico e, apontando os dedos para a velhinha, gritaram: “Bruxa! Bruxa! Bruxa!”. A esta altura, já não eram duas, mais quase uma dezena delas, pois várias outras meninas tinham se juntado á Abigail e sua prima. O juiz ficou impressionado com a manifestação e mandou que os jurados “repensassem” seu veredito. E assim o fizeram, declarando a ré culpada.
As famosas "Bruxas de Salem", em Massachusetts, nos Estados Unidos
Ela foi apenas a primeira. A histeria aumentou e as bruxas (e bruxos) foram sendo presos às dezenas. As garotas os acusavam de, à noite, sob forma de espíritos, visitá-las e forçá-las a assinar o livro do demônio, para vender suas almas. Era o bastante para que fossem presos e jogados nas masmorras. A onda se estendeu para outras cidades e vizinhos se acusavam, tentando resolver velhas disputas simplesmente acusando seu adversários de bruxos.
Condenado à morte por esmagamento, acusado de bruxaria no final do séc XVII em Salem, em Massachusetts, nos Estados Unidos
Pastor é enforcado por bruxaria em Salem, em Massachusetts, nos Estados Unidos
Vinte mortos (por enforcamento) depois, mais de cem pessoas na prisão e centenas de outros sob acusação, foi somente quando a própria esposa do governador foi acusada de bruxaria que, finalmente, o governador da província colocou um fim aos julgamentos. Isso porque, estando em um lugar que vivia sob leis “racionais”, esses julgamentos eram todos feitos pelo Estado, e não pela igreja, como era na inquisição europeia. Aqui, até pastores foram enforcados. Um bom exemplo de como as leis era seguidas é o caso de um senhor de posses de Salem que foi acusado e simplesmente se recusou a se declarar culpado ou inocente. Por isso, a lei dizia que não poderia ser julgado. A mesma lei dizia que, num caso desses, a pessoa deveria ser “convencida” a se declarar (culpado ou inocente), e o meio para esse “convencimento” era o esmagamento. Pois bem, ele foi colocado sob o enorme peso de muitas pedras por mais de dois dias, mas nada disse. Finalmente, suas costelas cederam e ele morreu. Mas, como ele não havia sido julgado, suas posses não foram tomadas pelo Estado (o que teria acontecido, caso fosse julgado e declarado culpado), e simplesmente foram herdadas pelos filhos. Filhos, aliás, que também tiveram a mãe enforcada (essa sim, com medo do esmagamento, se declarou inocente, foi julgada, condenada e executada). Anos depois, processaram o Estado e ganharam suas reparações.
Velejadores praticam seu esporte nas águas do Charles River, em Boston, capital de Massachusetts, nos Estados Unidos
Bom, enfim, nós estivemos nessa famosa Salem e visitamos o Museu das Bruxas. Afinal, tantos séculos depois, é claro que os americanos sabem faturar com essa história, que atrai centenas de milhares de visitantes anualmente. Hoje, tanto tempo depois, é difícil acreditar que isso tenha ocorrido de verdade. Mas a representação feita da história no museu nos ajuda a tentar entender o que realmente aconteceu. Tempos difíceis e incompreensíveis para nós. Nada como viver num mundo mais “racional”. Até quando, só o futuro dirá... A história mostra que a irracionalidade chega de surpresa e sopetão, vira o mundo de cabeça para baixo e depois, desaparece novamente. Que o diga os judeus que viviam na “racional” Alemanha da década de 20 ou os mulçumanos na civilizada Iugoslávia da década de 90. Pois é, a irracionalidade está muito mais perto de nós que possamos imaginar...
Passeio pela orla do Charles River, na chegada à Boston, capital de Massachusetts, nos Estados Unidos
Daí, seguimos para Boston, já bem no final da tarde. Fomos diretamente para Cambridge, onde estão duas das melhores e mais “racionais” universidades do mundo: Harvard e o MIT. Cruzamos o famoso Charles River, tiramos fotos e estamos ansiosos para que chegue o dia de amanhã, que será dedicado inteiramente à capital de Massachusetts. Antes disso, só temos de passar por uma noite onde os sonhos estarão cheios de bruxas...
Bruxas, principal atrativo de Salem, em Massachusetts, nos Estados Unidos
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